A cerca de uns dois meses começou a
circular em Campo Maior alguns boatos sobre uma oposição que o atual
bispo estaria sofrendo por parte de um grupo de fiéis católicos. Os
boatos se confirmaram com uma carta enviada ao núncio apostólico
denunciando Dom Eduardo. Como historiador e pastor Batista eu gostaria
de fazer uma análise desse embate.
Existe um secular estranhamento entre a
maçonaria e a igreja católica. Na teoria, isto é, na Lei Canônica, até
hoje a Maçonaria é repudiada pela igreja romana. Na prática, na maior
parte dos domínios católicos faz-se vista grossa a essa lei, o que
permite que maçons ingressem livremente na igreja e convivam em paz com
todos.
Polêmica em Campo Maior: carta pede saída de Bispo Dom Eduardo
Bispo evita imprensa e diz que dará explicações no momento certo
Bispo de Campo Maior responde João Alves e veta sua participação nos eventos da Igreja
Compreender e aceitar a Maçonaria tem
sido um desafio para todo o cristianismo. A igreja evangélica está
dividida quanto à aceitação da Maçonaria. Os evangélicos dividem-se em
muitas denominações: Batistas, Presbiterianos, Congregacionais,
Metodistas, Assembléia de Deus, etc. Alguns grupos, como os Batistas
(toda Igreja Batista é autônoma em suas decisões), não recomendam, mas
aceitam na igreja maçons, enquanto que outras igrejas Batistas não
querem a menor aproximação da Maçonaria. Um fato interessante aconteceu
na primeira metade do século XX, quando os Batistas do Piauí, por
algumas ocasiões, realizaram reuniões religiosas no salão maçônico
chamado “Pelicano”, em Teresina.
Isso só reforça que Batistas e maçons
não tiveram grandes ranhuras no passado. A tradição de
maçons-evangélicos ainda é mais forte nos Estados Unidos do que aqui no
Brasil. Outros grupos, como os presbiterianos, tiveram ferrenhas
disputas internas. Em 1900, a Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB)
contava maçons em sua comunhão. Mas esse fato não durou muito tempo. A
igreja dividiu-se por conta disso, surgindo do cisma a Igreja
Presbiteriana Independente (IPI) que aceitava maçons no rol de membros.
Mas em linhas gerais a maçonaria também não é vista com bons olhos no
meio evangélico.
Talvez o fato da Maçonaria ser vista
como uma sociedade secreta tenha levado a Igreja Católica a combatê-la a
ferro e fogo – muitas vezes erroneamente – associando-a com rituais e
práticas supostamente anti-cristãs. A imagem que se formou da maçonaria
no imaginário popular tem sido mais negativa do que positiva no meio do
cristianismo. Não podemos esquecer o fato de que no Brasil (mas não
apenas no Brasil!) a igreja sempre exerceu grande influência na vida das
pessoas. Quando a primeira fase da colonização do Brasil terminou, o
país já contava com um bom número de habitantes “letrados” e de cultura
eurocêntrica, com alguns maçons aportados vivendo por aqui, e assim foi
se disseminando a Maçonaria no Brasil.
A Igreja Católica, diante disso,
intensificou sua pregação contra a Maçonaria. Essa prática anti-maçônica
promovida pelos padres católicos talvez seja a explicação mais
plausível para justificar o receio dos católicos brasileiros com a
Maçonaria.
A Maçonaria, contudo, tem agregado
personalidades das mais diversas áreas: dentre os governantes, George
Washington e D. Pedro I eram maçons. O filósofo Voltaire e Goethe
também. Na música destacamos Bethoven e Mozart. Também eram maçons os
militares Napoleão Bonaparte e Garibaldi. A lista de personalidades é
muito grande. A maçonaria é a maior sociedade secreta do mundo, contando
atualmente com mais de seis milhões de membros espalhados pelo globo.
Quanto à pergunta: a Maçonaria é uma religião? Alguns membros dizem que
sim, outros dizem que não. No Brasil, a Maçonaria esteve presente
apoiando a Independência, a abolição da escravidão e a proclamação da
República.
A guerra da Igreja contra a Maçonaria
ganhou um capítulo novo em Campo Maior (já que os embates aqui são bem
antigos). No inicio de outubro foi divulgada uma carta, com a assinatura
de alguns católicos, onde o povo queixava-se do bispo de Campo Maior,
dom Eduardo Zieltski. Eram muitas as cobranças contra o bispo:
obscuridade quanto à venda do patrimônio da igreja, maus tratos aos
padres da paróquia e ao povo comum.
Mas o ponto principal da “zanga” dos
católicos responsáveis pela carta era a recusa do bispo em crismar
alguns jovens que participavam de uma sociedade ligada a Maçonaria: a
Ordem de Molay. Quando a carta foi divulgada eu comentei sobre isso e
uma rede social, afirmei as motivações, e recebi algumas críticas, mas
que agora se mostram infundadas. A carta foi dirigida ao núncio
apostólico do vaticano, Dom Geovanne D`aniello, pedindo providências
urgentes contra o bispo de Campo Maior.
Ontem o portal Campo Maior em Foco
divulgou uma carta-resposta onde o bispo de Campo Maior se dirige
especificamente ao católico-maçon João Alves Filho, considerando-o o
responsável pela carta que o denunciou ao núncio apostólico. Em sua
resposta o bispo foi taxativo ao afirmar: “penso que toda esta raiva se
deu por motivos de “DEMOLAY”. Os Demolay são ligados à Maçonaria. O
bispo não permitiu que alguns jovens recebessem a crisma pelo fato da
Igreja Católica se opor a Maçonaria, e isso desde os tempos mais
remotos.
E falo em termos mundiais! Enquanto instituição, a Igreja
Católica Apostólica Romana condena qualquer ligação dos fiéis com a
sociedade maçônica. Existem mais de 600 documentos, ao longo de 300 anos
e assinados por vários Papas, condenando a Maçonaria. Em outras
palavras, segundo o Vaticano, um católico romano NÃO pode ser um maçon.
Por sua vez, se um maçon quiser ingressar na Igreja Católica tem que
deixar a Maçonaria. Olhando somente para a “letra da lei” o bispo está
com a razão. Mas o problema aqui é maior: por que somente o historiador
João Alves está sendo crucificado? E quanto aos outros maçons, dezenas,
centenas, que são católicos em Campo Maior? E suas esposas e seus
filhos? Serão todos banidos? Se o bispo for imparcial, terá que aplicar o
rigor da lei a todo maçon da Paróquia e da diocese. Ai eu quero ver
peito pra isso.
Não é a primeira vez que Campo Maior
vive uma guerra declarada entre Igreja Católica e Maçonaria. Na década
de 1940, quando o padre Mateus chegou a Campo Maior, os maçons mais uma
vez foram alvos da fúria eclesiástica. E não somente os maçons, pois os
Batistas e os Espíritas também foram perseguidos. O próprio João Alves
Filho, escritor e historiador como é, relata esse episódio no seu livro
Mateus Rumo ao Céu. Segundo ele, padre Mateus disparava contra os maçons
como uma metralhadora. Praguejava contra maçons na missa e fazia alusão
ao famoso e temido “bode preto”. Chegou ao ponto de excomungar vários
fiéis da igreja. Bom, mas isso foi há 70 anos… Será? Na carta do bispo,
dirigido a João Alves Filho, consta uma severa punição ao historiador:
“O Senhor está excluído do grupo: Encontro de Casais com Cristo (ECC); é
vedado para o senhor qualquer pronunciamento público nas celebrações
nas igrejas, isto é, leituras, comentários, mensagens para os falecidos,
etc; durante os festejos está vedado ao senhor qualquer participação
tanto na preparação como na execução do festejo”, o bispo ainda deixou
subentendido, ao que parece, que João Alves não poderá participar da
“Santa Comunhão.” O bispo termina dizendo: “Estas decisões têm caráter
corretivo e espero que ajudem o senhor repensar as suas posições e se
converter.”
Mesmo com os cânones afirmando uma não
comunhão com a Maçonaria, a igreja não deixa de ter sua parcela de
culpa. Por quantos anos os maçons conviveram pacificamente na igreja de
Santo Antonio, em toda a diocese, com todos os padres e com o bispo Dom
Abel? Por que nunca foram avisados que estavam em desacordo com a
igreja? É injusto que João Alves seja um mártir sozinho nessa cruzada
medievalista. Mas ele está disposto a isso, e como os mártires do
passado, já declarou que não deixará a igreja e que o bispo não tem
poder sobre ele e sua fé: “O senhor não tem força para de me proibir em
absolutamente NADA. A não ser que o senhor mande a polícia prender-me e
colocar em mim, ALGEMAS. Se assim for a vossa vontade. Prepare-se.” Para
o bem de católicos e maçons, é melhor o Papa Francisco revogar logo
essa lei.
Fonte: Marcus Vinícius Costa Paixão*
Pastor Batista, formado no Seminário Teológico do Nordeste – STNe
Mestrando em Teologia no Seminário Servo de Cristo
Graduando em História pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI
Editor do jornal FOGE HOMEM
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