Imagem ilustrativa
A cidade de Nazaré do Piauí orgulha-se em ter a
escrava Esperança Garcia como referência nacional. O dia 20 de novembro é tido como
o Dia da Consciência Negra, sendo que o certo seria 6 de setembro. Cuja data
foi escrita a carta da escrava direcionada ao Governador do Piauí.
Esperança Garcia viveu na região entre Oeiras e
Floriano na fazenda de Algodões, a mais ou menos 300 km de Teresina, essa
fazenda juntamente a outras dezenas de estâncias pertenciam à inspeção de
Nazaré, (Comunidade Algodões) onde é hoje o município de Nazaré do Piauí.
Apesar de sua importância histórica, não se sabe quase nada sobre sua vida,
esse descaso da sociedade é conseqüência principalmente de sua condição de
negra escravizada. Porém ela se destaca por ter sido corajosa a ponto de
escrever uma carta ao governador do Piauí, Gonçalo Lourenço Botelho de Castro,
denunciando os maus tratos sofridos por ela, seus filhos e companheiras. A
carta é datada de 06 de setembro de 1770.
Afirma-se que a carta original está em Portugal,
e uma cópia foi descoberta no arquivo público do Piauí pelo pesquisador e
historiador Luiz Mott em 1979:“Outra minha importante descoberta arquivística
foi um pequeno documento, uma única página escrita a mão, todo cheia de
garranchos com muitos erros de português: trata-se de uma petição escrita em 1770,
por uma escrava do Piauí, Esperança Garcia. Trata-se do documento mais antigo
de reivindicação de uma escrava a uma autoridade. Documento insólito! Primeiro
por vir assinado por uma mulher, já que mulher escrever antigamente era uma
raridade. As mulheres eram vítimas da estratégia de seus pais, mantê-las
distante das letras, a fim de evitar que elas escrevessem bilhetinhos para os
seus namorados. Segundo, por se tratar de uma petição escrita por uma mulher
negra.”(Mott).
Esse documento serviu de inspiração para diversas
manifestações contemporâneas como o grupo de mulheres que trabalham pela
cidadania da mulher negra piauiense, e recebe o nome de Esperança Garcia assim
como ao Hospital em Nazaré do Piauí e a data desta carta é o dia estadual da
consciência negra no Piauí desde 1999.
Segue abaixo o modelo original da carta e sua
versão atualizada:
CARTA:
"Eu sou
hua escrava de V. Sa. administração de Capam. Antº Vieira de Couto, cazada.
Desde que o Capam. lá foi adeministrar, q. me tirou da fazenda dos algodois,
aonde vevia com meu marido, para ser cozinheira de sua caza, onde nella passo
mto mal. A primeira hé q. ha grandes trovoadas de pancadas em hum filho nem
sendo uhã criança q. lhe fez estrair sangue pella boca, em mim não poço
esplicar q. sou hu colcham de pancadas, tanto q. cahy huã vez do sobrado
abaccho peiada, por mezericordia de Ds. esCapei. A segunda estou eu e mais
minhas parceiras por confeçar a tres annos. E huã criança minha e duas mais por
batizar. Pello q. Peço a V.S. pello amor de Ds. e do seu Valimto. ponha aos
olhos em mim ordinando digo mandar a Procurador que mande p. a fazda. aonde
elle me tirou pa eu viver com meu marido e batizar minha filha q.
De V.Sa. sua
escrava Esperança Garcia”
CARTA TRADUZIDA:
"Eu sou uma escrava de V.S.a administração de Capitão Antonio
Vieira de Couto, casada. Desde que o Capitão lá foi administrar, que me tirou
da Fazenda dos Algodões, aonde vivia com meu marido, para ser cozinheira de sua
casa, onde nela passo tão mal. A primeira é que há grandes trovoadas de
pancadas em um filho nem, sendo uma criança que lhe fez extrair sangue pela
boca; em mim não poço explicar que sou um colchão de pancadas, tanto que caí
uma vez do sobrado abaixo, peada, por misericórdia de Deus escapei. A segunda
estou eu e mais minhas parceiras por confessar a três anos. E uma criança minha
e duas mais por batizar. Pelo que peço a V.S. pelo amor de Deus e do seu
valimento, ponha aos olhos em mim, ordenando ao Procurador que mande para a
fazenda aonde ele me tirou para eu viver com meu marido e batizar minha filha.
De V.Sa. sua escrava, Esperança Garcia"
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