O DIA começa hoje uma série de reportagens para lembrar os 50 anos do golpe militar que mergulhou o país em duas décadas de ditadura
Rio - Quando reuniu milhares de pessoas em frente à Central do Brasil, há exatos 50 anos, o então presidente João Belchior Marques Goulart, de 45 anos, o Jango, sabia que estava no centro de uma conspiração militar que queria derrubá-lo. Naquele 13 de março, Jango subiu ao palanque com a mulher, a bela Maria Thereza Fontella Goulart, uma jovem de 24 anos; o cunhado e fiel escudeiro, Leonel de Moura Brizola, 42; e um revólver na cintura. Estavam todos em frente ao atual Palácio Duque de Caxias, que foi o Ministério da Guerra até 1971.
Jango
falou das Reformas de Base que defendia para o país — incluindo a
agrária e a eleitoral —, chamou de “eles” aqueles que queriam “uma
democracia de povo emudecido, amordaçado” e deixou claro que sabia o que
se passava à sua volta. Mas supervalorizou o apoio popular que tinha:
“Sei das reações que nos esperam, mas estou tranquilo, acima de tudo
porque sei que o povo brasileiro já está amadurecido, já tem consciência
da sua força e da sua unidade, e não faltará com seu apoio às medidas
de sentido popular e nacionalista.”
Jango falou em revisão da
Constituição, que chamou de “antiquada”, e anunciou a encampação de
refinarias. Tinha ao seu lado trabalhadores, sindicatos e parte das
Forças Armadas. Os dias seguintes mostrariam que era uma parcela
insuficiente para garantir sua permanência no cargo, mas foi a esses
militares que o presidente se dirigiu: “Graças à colaboração patriótica e
técnica das nossas gloriosas Forças Armadas, em convênios realizados
com a Supra, (...) espero que dentro de menos de 60 dias já comecem a
ser divididos os latifúndios das estradas.”
Supra era a Superintendência de
Política Agrária, cuja criação Jango anunciou no comício da Central. Mas
o que aconteceu em bem “menos de 60 dias” foi o golpe militar que o
derrubou e impôs ao Brasil duas décadas de uma ditadura que prendeu,
torturou e matou quem se opôs ao regime. Àquela altura, os militares
golpistas tinham apoios de sobra na elite, classe média e imprensa,
convencidas de que Jango era um “subversivo”. Acreditando na promessa
dos militares de que haveria eleição indireta para presidente em 1966,
grande parte do país queria de volta a “Ordem” da Bandeira Nacional.
O cientista político Paulo Baía avalia que,
embora soubesse da conspiração que estava em curso, Jango achou que
tinha mais apoio das Forças Armadas e foi surpreendido quando militares
de alta patente apoiaram o golpe.
“Ele acreditava que aconteceria com ele o que
aconteceu com Juscelino Kubitschek”, explica Baía. Nos Anos JK houve
tentativas de golpe militar que nunca vingaram. Mas também lembra que
não havia no tempo de JK, nem no mundo nem no Brasil, o acirramento
entre ‘capitalismo’ e ‘comunismo’ da década de 60.
Em 1959, Fidel Castro saiu vitorioso em sua
Revolução Cubana e trouxe o socialismo do Leste Europeu para o coração
das Américas. Em 1963, o presidente americano John Fitzgerald Kennedy
foi assassinado em um atentado até hoje mal explicado. Em 1964, o pior
pesadelo dos Estados Unidos era a possibilidade de o Brasil virar uma
imensa Cuba, liderada por um ‘comunista’. O destino de Jango estava
traçado.
EM PRAÇA PÚBLICA
“Chegou-se a proclamar até que esta
concentração seria um ato atentatório ao regime democrático, como se no
Brasil a reação ainda fosse a dona da democracia e a proprietária das
praças e das ruas. Desgraçada a democracia se tiver que ser defendida
por tais democratas. Democracia, para esses democratas, não é o regime
da liberdade de reunião para o povo. O que eles querem é uma democracia
de povo emudecido, amordaçado nos seus anseios e sufocado nas suas
reivindicações. A democracia que eles desejam impingir-nos é a
democracia antipovo.”
Fonte: O Dia
Nenhum comentário:
Postar um comentário